quinta-feira, 30 de junho de 2016

Pensando fora de foco














Essa semana fiz uma experiência meio maluca com o meu sentido da visão. Queria saber a sensação de não ver. Ou pelo menos de ver bem pouco, quase nada. Entender melhor como é o mundo para as pessoas que são imunes ao extremo apelo visual desses nossos tempos.
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Pode parecer extravagante, mas não estou inventando. Estou mesmo com problemas nos olhos há alguns meses. São cataratas. É como um véu espesso encobrindo o mundo a minha volta. Uma experiência muito estranha e perturbadora pra mim.
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Primeiro, comecei a andar de olhos fechados dentro de casa. Dia seguinte acordei e coloquei uma bandana nos olhos, como uma venda, e já me levantei tateando bem devagar. Consegui tomar banho, me vestir, depois comi umas frutas, tomei um copo de suco e sentei no escritório. Liguei o computador e tentei escrever alguma coisa. Foi tudo mais lento do que nunca, mas sem muitos problemas. Não tropecei nem me machuquei porque conheço onde estão todas as coisas de que precisava. É a minha casa. E no escritório, eu sabia que o computador ia abrir no programa de texto, nenhuma novidade. E também que os meus dedos tem a memória do teclado, então... quer dizer, quero uma coisa mais desafiante.
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Abre um parêntese. Pra explicar melhor, não estou cega. Eu vejo a luz, as sombras, os contornos, o geral. Mas tudo está envolto em um véu, como uma neblina forte. Pra ver os detalhes preciso chegar bem perto das coisas ou pessoas. Pra usar o computador ou o celular, fico com o rosto colado na tela. O que é cansativo pra caramba. Fecha o parêntese.
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Tive certeza que precisava sair, comprar alguma coisa pro fim de semana. Estou sem os dois óculos, o original e o dublê, que quebraram as hastes, e não vou fazer outro agora, tão perto da cirurgia. Então peguei um táxi e fui na super padaria assim mesmo. E do jeito que eu estou, tudo fica muito engraçado. Porque quase entro na vitrine pra ver as coisas, as pessoas estranham, não sabem se sou meio cega ou somente metida a engraçadinha... rs
Tateei, procurei e foi então que me lembrei de minha avó, que dizia “a gente não vê só com os olhos, menina”... isso é a maior verdade... então fui atrás do que eu queria: o queijo pro sanduba, o queijo pra ralar, as frutas não tão maduras pra comer no meio da semana, pão de queijo, o leite integral, que tem a caixinha igual, só que de outra cor. Fui pelo tato e pelo cheiro, algumas coisas pelo paladar. Enchi a cesta, depois a coloquei um pouco no chão pra receber o pão fresquinho no balcão, peguei a cesta de volta e segui pro caixa. Paguei e vim pra casa.

E quando cheguei foi que eu vi. Não eram as minhas compras! Acho que troquei as cestas no balcão, com a minha visão de toupeira... rsrs. Nas sacolas que eu trouxe tinha pernil assado (eca!), os legumes que já tinha em casa e por isso não comprei, iogurte desnatado, pães, alguns patês com bastante maionese, essas coisas que nunca compro porque não uso, mas as pessoas carnívoras gostam muito...
Confesso que não aproveitei nada, só o pão, mas fiquei sem vontade de voltar na padaria e assim deixei tudo como estava. O melhor a fazer era aguardar a chegada de alguém que goste daquilo tudo para fazer uma doação. Ou que me acompanhe de volta à padaria para trocar os produtos.
Quer dizer, achei que não adiantou de nada tanto esforço.
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Mas acho que adiantou sim. Me fez sentir um desconcerto emocional enorme, sim, mas também me mostrou o quanto esse excesso de informações que me chega todo dia é quase como a deficiência visual. Olho tanta coisa e no fim não vejo quase nada. Foi incrível perceber isso.

Quando eu era criança, a minha avó (sempre ela) de vez em quando fazia algumas coisas corriqueiras com as crianças, mas de uma maneira diferente. Por exemplo: dormir um dia no banheiro. Ou almoçar embaixo da mesa. Então a visão diária que a gente tinha das coisas, mudava completamente. A gente não só via as coisas de outro ângulo, como também se abria para as coisas minúsculas, como um buraquinho de formigas que existia na quina da banheira, por exemplo, e que me encantou.


Acho que estava mesmo precisando disso...

segunda-feira, 27 de junho de 2016

O pisca pisca dos pirilampos.

















Acordei no meio da madrugada com o maior frio, precisei pegar outra coberta pra me aquecer e relaxar. E no quarto todo escuro,  vi algumas luzinhas brilhando no teto. Umas seis, de brilho fraquinho e quase dourado, mudando de lugar como se estivessem dançando. 
Achei que era sonho e fiquei um tempo curtindo porque era bem bonito... 
Aí voltei a dormir e sonhei que estava sendo embalada pelas pequenas fadinhas dos reinos de fantasia da minha infância.
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Hoje de manhã encontrei cinco vagalumes mortos no chão. Reduzidos à sua prosaica e efêmera condição de insetos voadores, um pouco menores que mariposas, com o traseiro gordinho como o das tanajuras.
Mortos e comuns, sem nada de especial.
Acho que a luz dos pirilampos se alimenta dos sonhos das pessoas, só pode ser...












Mas na real, as comidas preferidas deles são as lesmas e os caramujos! Não sabia dessa... A gente sabe pouca coisa desses bichinhos, como que eles nascem de ovos, por exemplo, ou que as larvas também tem luzinhas nos traseiros. Mas a coisa mais importante sobre eles que aprendi hoje, é que foi baseado na sua bioluminescência que os cientistas criaram as lâmpadas de LED... Essa foi demais.

Quando eu era criança, nas férias na praia, uma das tarefas preferidas da noite era catar pequenos vagalumes e colocar num vidro fechado, que maldade. As vezes com papel celofane colorido dentro, pra ficar cheio de magia... Mas ficávamos com uma lanterninha linda, que durava dois três dias, e depois a tampa era aberta e os pirilampos iam embora.
Essa é uma lembrança afetiva de minha infância.
Adoro pirilampos...


domingo, 26 de junho de 2016

Sopa mágica pra curar a gripe.




















Tem uns dois dias que estou enrolada com uma gripe pesada, ontem tive até febre. É aquele quadro clássico: o corpo dói, a cabeça parece que vai abrir ao meio e a vontade de ficar na cama é maior do que tudo. Também não quero ver ninguém e nem comer nada.  O que eu queria mesmo, e nem tenho vergonha de dizer, era um colo quentinho e macio, uns cafunés na cabeça, abraços e beijinhos até ficar boa... ah... 
(acorda Beth, deixa de ser carente).

Aí me lembrei de uma tradição lá de casa, que a minha avó fazia pra todas essas ocasiões de coração partido ou fraqueza momentânea. Era tiro e queda. Uma sopinha quente de fubá com espinafre. Nada mais confort food que isso. A minha salvação...
Não tinha espinafre na geladeira, mas tinha couve na horta e aí troquei sem nem pensar. Os dois são ricos em ferro, o que é ótimo para o sistema imunológico. E como estou gripada acrescentei gengibre, que limpa as vias respiratórias e dá um gosto especial pra qualquer alimento. Vou dar a minha receita, mas acrescento que você pode mudar da maneira que quiser, e de acordo com o que estiver disponível na sua geladeira.

Essa é a receita de minha avó.

2 dentes de alho bem picados
1/2 cebola média picada
6 colheres de sopa de fubá
4 xícaras pequenas de água 
2 folhas de couve ou qualquer outra verdura cortada bem fininha 
1 colher pequena de gengibre ralado 
Sal a gosto


Como fazer
Em uma panela alta e em fogo médio, refogue o alho e a cebola em um fio de óleo até dourar (as vezes ela trocava o óleo por manteiga. Eu prefiro manteiga, fica mais saboroso). Acrescente o gengibre, o sal e deixe pegar gosto. Em seguida coloque o fubá. Minha avó jogava o fubá diretamente na mistura, mas quem não tem o hábito corre o risco de empelotar a sopa. Quem preferir pode diluir o fubá com um pouco dágua antes de colocar no fogo. Deixe cozinhar por cerca de cinco minutos, e mexa sempre para não queimar. Acrescente a couve picada, misture e deixe cozinhar por mais um minuto ate engrossar.  É melhor usar uma panela alta, porque a sopa borbulha muito e pode queimar a sua mão, como aconteceu comigo.
Desligue e está pronto!

sexta-feira, 24 de junho de 2016

Eu, Gonzagão e a Lua Cheia














Luiz Gonzaga é a cara do Nordeste, principalmente nessa época de São João. Não quero falar aqui da importância dele pra musica brasileira, nem o quanto influenciou outros compositores, nem mesmo sobre o imenso resgate da cultura nordestina que ele possibilitou com sua figura, vestido de vaqueiro, de chapéu e sanfona branca. Isso todo mundo sabe.
Quero contar meu primeiro encontro com ele, quando conheci o velho Januário, que não tocava mais a sua sanfona de oito baixos e o resto de sua família.  Até dormi na sua casa em Exu! Tudo começou assim:
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Luiz Gonzaga foi um superstar da época do rádio, mas em 68 sumiu dos noticiários, a garotada só queria saber da Bossa Nova, da Jovem Guarda, do rock e do Tropicalismo. Nada de sanfona, ele era uma figura do passado. 
Aí um dia, em seu primeiro número, a revista Veja saiu com uma noticia que deu muito o que falar: The Beatles traduziu Asa Branca para o inglês e incluiu a música no LP que ainda ia ser lançado (conhecido como Álbum Branco). A música teria recebido o nome de Blackbird. (hahaha).
A novidade tinha sido revelada pelo apresentador Carlos Imperial em seu programa na TV Rio. E como era difícil o acesso aos músicos fora do Brasil, a noticia não conseguiu ser comprovada e só atiçou a imprensa. Luiz Gonzaga deu muita entrevista, recebeu convites para show e aparições na TV. Estava todo feliz. Só se falava nisso.












O jornal que eu trabalhava (Jornal do Brasil) me mandou ir até Gonzaga e saber que história era aquela com os Beatles. Deixar ele bem à vontade para contar tudo. Então fui de carro com um fotógrafo (que não consigo lembrar quem era), pra Exu, no Sertão pernambucano. Exu fica embaixo da Serra do Araripe, na divisa com o Ceará. Lá Gonzaga nasceu e morava.

A casa era enorme, dentro de uma fazenda, com bois e cabras, galinhas e muitos alojamentos de trabalhadores. Do lado da casa grande tinha um tipo de pousada, para receber os hospedes. Ali ficamos. E mais na frente, depois de um pé de oiti, ficava a casa do pai de Luiz, o seu Januário, que já não tocava a sua sanfona de oito baixos. Nessa dia almoçamos com a família - Luiz, sua mulher, seu Januário, e o gerente da propriedade. A comida era uma delicia: carne de sol, farofa, manteiga de garrafa, salada e suco de cajá. A tradicional comida dos sertanejos.  Conversamos e conversamos e conversamos noite adentro.


















Seu Luiz contou que a história dos Beatles tinha sido uma invenção de Carlos Imperial, com a nobre finalidade de resgatar o seu prestígio perante um público que o desprezava. Ele achou que era tudo verdade. Depois da enorme repercussão na imprensa, a mentira saiu fora de controle e Carlos Imperial ficou preocupado. Foi então que contou tudo ao Gonzaga, mas ele não quis nem ouvir. “Eu só tinha que agradecer a ele e aproveitar a maré. Sei que foi cascata, mas foi bom demais pra mim. Ganhei dinheiro, ganhei programa, dei entrevistas”.

Luiz Gonzaga voltou à mídia depois disso, com a ajuda dos tropicalistas, mas, segundo ele, aquela historia o deixou bem pensativo. Ele não tinha mais certeza de quais musicas, entre as muitas que compôs, eram realmente dele. Mesmo a Asa Branca, composta em 1947, em parceria com Humberto Teixeira. Segundo ele, essa era uma canção já popular em Exu, sua terra. Ele e o parceiro teriam apenas feito algumas melhorias.
ele repetiu depois essa historia pra vários jornalistas, mas na hora eu fiquei pasma... 
- Eu cantava músicas dos outros e os outros cantavam minhas músicas, sem preocupação com direitos autorais. Deve haver por aí muita música que inventei, passei adiante e que agora faz parte do folclore nordestino.

Asa Branca ficou conhecida a partir da gravação de Luiz Gonzaga, vendeu milhões de cópias e ganhou versões de mais 310 intérpretes em várias línguas. Menos a dos meninos de Liverpool. A história não passava de fantasia de Carlos Imperial.

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Na noite da véspera da nossa partida, Gonzaga nos convidou pra ir num lugar especial. De carro pegamos a estrada que subia a Serra do Araripe e paramos lá em cima, na divisa dos dois estados. De um lado, estava Exu, em Pernambuco. Do outro, Juazeiro do Norte, terra do Padim Ciço, no Ceará.
Ele parou o carro e mandou a gente descer e olhar na direção de Exu. E lá estava uma bola amarela, enorme e magnética. Era a Lua Cheia mais linda que eu já tinha visto.

Igual à que está agora aqui, no meu horizonte, no Planalto Central.

















Essa foto, do arquivo da família, mostra Seu Januário com sua sanfoninha de oito baixos, ao lado de Dona Santana, tocando o bumbo e os filhos em volta. Luiz Gonzaga está com o triângulo. Era um dia de São João.

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Espada de São Jorge, amor puro amor verdadeiro



Acho que a primeira planta por quem me apaixonei na vida foi a “Sansevieria trifasciata”, conhecida como Espada de São Jorge. Digo, a primeira planta de vaso, porque árvores tinham muitas no quintal, mas eram independentes e não precisavam de mim.

Me lembro muito bem de uma folha da Sansevieria que peguei na rua, ia pro lixo de alguém, e em casa resolvi enfiar na terra de um pequeno vaso de plástico. E fiquei de tocaia, todo dia olhava pra ver o que ia acontecer. Um dia quase não acreditei: junto à base daquela folha amassada e triste, estava surgindo uma pequena folhinha verde e cheia de vida.
Eu tinha uns 8 anos, e aquele foi talvez o primeiro milagre com que o reino vegetal me deslumbrou.
Desde então cultivo uma enorme ligação afetiva com as plantas. Gosto de todas, não existe nenhuma planta no nosso universo que não receba meu amor e meus cuidados, mas com a Espada de São Jorge eu tenho uma história...

Como é uma planta muito comum, que podemos encontrar em todo canto, as pessoas não lhe dão a devida importância. Mas de comum ela não tem nada! A gente encontra as Sansevieria em várias formas, grandes e pequenas, altas e baixas, listradas e com as bordas amarelas. São todas parentes, partes do mesmo gênero botânico e com as mesmas propriedades. Sua flor é miudinha e muito perfumada.


















É CONSIDERADA UMA PLANTA SAGRADA
Como Espada de Ogum, essa espécie tem papel importante nos rituais das religiões afro brasileiras, sempre presente nos terreiros desse orixá. Ogum é um guerreiro destemido, deus dos ferreiros, que ensinou aos homens como forjar o ferro e o aço. E pela sua forma, a Sansevieria trifasciata representa a sua espada mágica. Outra variedade, de nome Sansevieria cylindrica, de folhas compridas, é a sua lança.
No Brasil, o santo católico São Jorge está associado a Ogum, pelo que a espada e lança de Ogum passaram também a serem conhecidas como Espada e Lança de São Jorge.














(a lança de São Jorge)

É UMA PLANTA QUE PURIFICA O AR
Em todas as suas formas, as Sansevieria são consideradas uma das melhores purificadoras do ar em todo o reino vegetal. Por isso são aconselhadas para uso em ambientes fechados.  
Quem deu aval a essa teoria foi a NASA, através de estudos feitos pelo cientista Bill Wolverton, e publicada em livro recentemente.
Simulando um ambiente respirável num habitat lunar, os cientistas descobriram que algumas plantas são os melhores filtros para poluentes comuns, como amônia, formaldeído e benzeno. Entre essas poucas estava a Sansevieria.


SÃO MUITO FÁCEIS DE CUIDAR
As Sansevieria se adaptam bem a qualquer ambiente, mesmo com pouca luz. Elas preferem muita luz sem sol direto, claro, mas crescem bem em contato direto com o sol. Assim como também se adaptam bem ao ar condicionado.
Mas não curtem muito regas frequentes. No verão, basta regar uma vez por semana sem deixar o solo encharcado. E no inverno, uma vez por mês. 
A Sansevieria prefere ficar sossegada no seu vaso durante o máximo de tempo possível, mas é bom trocar a terra de dois em dois anos, para que raízes não fiquem muito apertadas no vaso.  Para adubá-la, é melhor escolher o período da primavera até o outono. Adubo orgânico, claro.
Também não é necessário podar uma planta dessas. Apenas corte as folhas mais velhas rente ao solo e enfie na terra para reprodução. Elas vão se reproduzir em folhinhas verdes e viçosas e você vai ficar deslumbrada.

Exatamente como essa historia aqui começou...

terça-feira, 21 de junho de 2016

A coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer





















Eu nunca pensei muito nesse negócio de idade, de ficar mais velha, de cabelos brancos e etc. Me lembro que quando era menina e perguntavam o que ia ser quando crescesse, sempre respondia: “quero ser uma mulher de 30 anos”. As pessoas achavam engraçadinho, mas quando eu falava isso, não tinha a menor ideia do que significava 30 anos pra uma mulher. Pra mim era apenas a idade de uma amiga de minha tia, que tinha pouco mais de trinta e usava vestidos lindos, sapatos de salto alto, batom vermelho e principalmente fumava e falava palavrões. Queria ser assim, solteira e dona de minha vida...

Depois não lembro direito como o tempo passou. Era muita coisa acontecendo... Muitas mudanças no país, na minha família, em mim mesma. Fiz três vestibulares (que na época não eram unificados), passei nos três, comecei a universidade de manhã, de tarde e de noite. Desisti de dois e fiquei só com jornalismo. Comecei a trabalhar em jornal, depois do AI-5 fui expulsa da universidade por ser subversiva,  virei hippie, viajei o país inteiro fazendo reportagens, me apaixonei muito, fui muito amada, morei em comunidade alternativa, adotei a macrobiótica e a ioga, fui morar com um homem por quem me apaixonei, tive dois filhos com ele, aí sosseguei um pouco. 
Depois me separei, viajei, viajei, fiz parte de um grupo feminista, com esse grupo fiz livros e vídeos sobre saúde da mulher, apresentei um programa de radio, encontrei o grande amor de minha vida, tive outro filho, virei produtora cultural, abri duas empresas, tive um restaurante/bar, mudei de cidade, de estado, sempre trabalhando com shows.... ufa... e vivi tudo isso intensamente e fui muito feliz.

Ai o meu amor morreu e meu mundo virou de cabeça pra baixo. E foi só depois disso que tive plena consciência da passagem do tempo. Aquela adrenalina que sempre foi a minha vida acabou... se antes eu era Aries e nesse momento virei Peixes (ascendente). E fui me olhar no espelho e vi que estava muito diferente do que eu era. Ou pelo menos do jeito que eu achava que era... tomei um susto! Falei: Caraca, ano que vem vou fazer 70 anos! Setenta. Setentinha. 3 x 20 + 10. Ou duas vezes trinta e mais dez. E onde ficaram esses anos todos, como eu não vi passar? Difícil dizer.

Hoje minha cabeleira não é mais tão farta nem loura. Os fios são  grisalhos e não escondo mais com tintura, deixa assim. Surgiram as rugas e o brilho da pele se foi. Minha postura corporal também mudou. Podia estar pior, mas dancei muito e fiz ioga por muito tempo, então isso ajudou. O que acontece é que sou hoje uma mulher mais gordinha e calma e recolhida. As crianças me chamam de vovó onde quer que as encontre... E eu gosto, viu?

Mas acho que essa idade é só por fora. Uma vez estava indo pra um teatro com Caetano, no carro da produção, nem sei em que cidade, e a gente conversava exatamente sobre isso, de como o tempo passa tão rápido e a gente nem percebe. Ele falava da mãe dele, que ia fazer 100 anos e achava que ainda era jovem e tratava os filhos como se fossem garotos, dando bronca e tudo. Ele acreditava que todo mundo tem uma idade interna que pode ser completamente diferente da idade do corpo físico. E que essa idade era a gente que escolhia, entre os momentos mais felizes da nossa vida.
Concordo demais com ele. E acho que minha idade eterna é uns 35 anos, naquela época em que vivia mais perto da natureza, com crianças pequenas ao redor, bichos, plantas. São momentos de que me lembro com saudades.

Acho que por isso hoje moro na roça, convivendo com netas e amigos de netas, plantando, ouvindo muita musica, comendo meu arroz integral, vivendo minha vidinha vegetariana e fazendo meditação. Escolhi que a minha batalha hoje é pela qualidade de vida, consumindo somente o necessário, respeitando os ciclos da natureza, convivendo e trocando com as pessoas locais. Ainda não está excelente, mas estou no caminho.
Sei que estou envelhecendo, os sinais já são muito claros, os olhos vão passar por uma cirurgia na próxima semana, por exemplo. Porém me olho no espelho e não fico chateada comigo, não. Podia estar mais jovem se fizesse uma plástica ou se fosse mais na academia, ou mesmo se voltasse aos esportes. Mas não fiz nada disso, acho que nem vou fazer... No meu corpo está a minha história. Foram tantas coisas que já me aconteceram que não podia ser diferente.
E tenho certeza que muitas novidades ainda virão... 
Estou meio velhinha, mas estou viva!

(Tenho anotações de todas as coisas que ainda me lembro e que foram importantes pra mim, e um dia desses publico por aqui).


É muita história, viu?

domingo, 19 de junho de 2016

Chico Buarque, um artista brasileiro





















Francisco Buarque de Holanda – 72 anos hoje, é uma das principais figuras dessa geração de grandes artistas brasileiros, que chegaram agora nos 70. Um dos maiores cronistas da vida nacional, principalmente aquela miudinha e invisível, que ele retrata com riqueza poética, lirismo, sutileza e rigor.
Ultimamente tem sofrido alguns achaques pelas suas posições políticas, mas no geral é amado pela população, que o considera quase como um amigo ou irmão mais velho.
Eu amo demais...


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Tenho umas histórias envolvendo o Chico, que vou contar por aqui.

-- Minha primeira visão dele foi mais ou menos em 69, em Olinda, na casa de sua irmã Maria do Carmo, apelido Pii, nossa amiga, que também morava no sitio histórico da cidade. Pii tinha uma gata que deu cria, e fui lá, conforme combinado, pra pegar dois filhotinhos. E ele estava na sala, sentado numa cadeira de balanço. “Esse é meu irmão Chico”. “Oi, tudo bem?” e conversamos besteira um pouquinho, depois peguei meus gatinhos, me despedi e vim pra casa. Só algum tempo depois, a besta aqui juntou os pontos e descobriu que o irmão dela era o autor de “A Banda”... uau!
-- Depois, em 73, quando me mudei pra São Paulo. Um amigo jornalista pra quem eu já tinha feito uns frilas, me pegou no aeroporto e disse que a gente ia no aniversário do pai de um amigo, que ia ser bem animado e que eu ia gostar. E fomos pra uma linda casa no Pacaembu. O amigo do meu amigo era Álvaro, irmão do Chico. O aniversariante era Sergio Buarque de Holanda... A casa estava cheia, gente de diferentes faixas etárias e na mesa um sensacional cozido completo. Todo mundo comendo e bebendo, musica, risos. Fui apresentada como amiga da Pii e muito bem recebida. A cabeça dava tantas voltas, nem consigo dizer quem estava na festa. Lembro bem do Sergio com Bebel, bem pequena, representando uma pequena peça, onde inverteram os papéis: ela era a avó e ele o netinho. Incrível. Tenho a impressão que o Chico não estava...
-- Anos depois fiz dois shows com ele. O primeiro, mais ou menos em 82, pro Natal Sem Fome, do Betinho e Dom Helder, show na praia de Boa Viagem, um palco enorme, mais de 20 artistas se apresentando. A entrada era um quilo de alimentos não perecíveis. Uma loucura para a produção, tudo com horário de entrada e saída do palco cronometrado... Ele fechava a noite, claro, e podia cantar quantas músicas quisesse. E foi super profissional. Era um show sem cachê pra ninguém, artistas, técnicos, produção. Todo mundo dando o seu melhor pelo projeto. Foi lindo demais.
-- O outro show foi no palco externo do Circo Voador, casa abarrotada, sold out dois dias antes. Esse eu não lembro muito porque tinha acabado de parir meu filho mais novo, e à noite não pude ir até lá. Apareci na passagem de som, e voltei correndo pra amamentar... Mas fiz toda a divulgação, pra jornal, rádio e TV. Escrevi cada um dos textos.
E foi só...

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Mas como fiz com Bethania ontem, seguem algumas coisinhas sobre Chico, pinçadas da internet.

ELE
-- Sua primeira composição foi escrita quando ele tinha 15 anos. O nome era Canção dos Olhos. Mas a primeira gravação foi uma marchinha, em 1964, de nome Marcha Para Um Dia de Sol, interpretada por Maricene Costa.
-- Chico fez até o segundo ano de Arquitetura, na FAU da USP. Saiu porque a música falou mais alto. Segundo ele “larguei a Arquitetura e virei aprendiz de Tom Jobim”.
-- Ele não é recluso ou tímido, como se costuma pensar. Pessoas próximas dizem que ele é falante e engraçado. Só que faz questão de manter a sua privacidade.

A SUA CASA
-- Depois que deixou de dividir com Marieta Severo a casa na Gávea, Chico mora num ap numa rua sem saída no Leblon, na cobertura de um prédio, de onde se vê toda a praia do Leblon, Ipanema e até o Arpoador. Tão alto e isolado, o ap parece flutuar no mar.
-- Ele diz que gosta desse apartamento porque é indevassável. O máximo que se consegue ver dele é alguma luz acesa. Isso porque ele tem obsessão por privacidade.
-- O apartamento é duplex. No andar de cima tem uma sala, cozinha, varanda, sala de tv, quarto de hóspedes, escritório, o quarto dele com banheiro. No de baixo, outro escritório, uma sala de tv pra ver filmes com os netos, banheiro e outro quarto de hospedes.
-- Não há ligação interna entre os dois apartamentos. Todo dia ele sai de casa pra ir trabalhar, entra por uma porta independente, desce um andar e se tranca. No escritório de cima, ele é músico. No de baixo, é escritor.

SUAS MANIAS
-- Chico adiou muito o momento de usar o computador. Preferia receber tudo por fax. Mas agora usa programas de texto pra escrever suas coisas, tem email (quase secreto), mas quase não entra na internet. Fora isso, quase nem toca no computador.
- Gosta de ler jornais de papel. Lê pelo menos três por dia, da sessão de economia ao necrológico, passando também pelo horóscopo e os classificados. Também lê de vez em quando revistas da França e dos Estados Unidos.
-- Quando está escrevendo, Chico se isola e lê compulsivamente. Literatura brasileira contemporânea e literatura estrangeira, os franceses no original.
-- Escuta pouca musica em casa, mas quando está compondo, gosta de ouvir os clássicos do samba, muito Tom Jobim, além dos clássicos vintage norte-americanos. E os cubanos. É muito atencioso com quem lhe envia ‘demos’. Pode até não gostar, mas ouve todos.
-- Em casa vê pouca televisão, apenas futebol e alguns filmes tarde da noite, quando tem insônia.
-- Caminha três vezes por semana, por volta de uma da tarde, um trajeto de 6km. Anda rápido com físico de atleta. As vezes tem a companhia de um amigo, mas quase sempre vai só.

OS AMIGOS
-- Além da ex Marieta, das três filhas e da irmã Miucha, seus amigos íntimos são os músicos Edu Lobo e Carlinhos Vergueiro, os cineastas Ruy Solberg e Miguel Faria e o escritor Eric Nepomuceno.
-- Com os amigos janta religiosamente uma vez por semana, pedindo sempre os mesmos pratos: espaguete com camarões e pimenta ou molho pesto. Quando está na fase light pede peixe grelhado. Não bebe mais destilado algum. Só vinho e suco de laranja. E depois do jantar, uma grapa.
-- Com os amigos também joga futebol todos os sábados, no campo que recebeu como pagamento de contrato de uma gravadora, no Recreio dos Bandeirantes. Seu time de futebol se chama Politheama. Torce ardentemente pelo Fluminense, mas não vai mais ao estádio, prefere ver os jogos na tv.

O ANIVERSÁRIO
-- Como todos os anos, é possível que se esconda nessa data, para fugir de comemorações e homenagens. O local preferido é um apartamento que tem em Paris, no ultimo andar de um prédio no Marais. Seu fechado círculo de pessoas íntimas sabem onde ele está, mas como ele, ficam em silêncio.

ENVELHECER
-- “É preciso assumir o seu tempo, assumir a idade que você tem e não ficar se desesperando por causa disso... Hoje sou um senhor, um senhor de respeito... Mas desde garotinho eu sempre desconfiei que ia ficar velho... E é a melhor coisa!"...

Beijo enorme pra ele, sou fã de carteirinha...