O nome dele era Antônio
Gonçalves da Silva, e mal sabia o bêabá, como se diz, mas lia tudo que encontrava
pela frente com o único olho que lhe restava. E fazia versos com tamanha
perfeição que recebeu seis títulos de doutor Honoris Causa de universidades
nordestinas, além de outras homenagens, e foi considerado um dos mais
importantes poetas do Ceará, com 13 livros publicados.
Sim, ele era cearense. Nasceu,
sempre viveu e morreu na cidade de Assaré, a 490km de Fortaleza. Numa
casa de pau a pique, limpíssima, com retratos dos filhos, do Padim Padre Cícero
e outros santos nas paredes. Teve 9 filhos com a fiel companheira Belinha, com
quem esteve casado por 60 anos. Sua morte, 8 anos antes, o deixou arrasado.
O trabalho de Patativa se
diferencia dos outros porque é muito oral. Ele sabia de cor todos os seus
poemas, e são mais de mil! Imagine que memória prodigiosa... Vê-lo em ação era uma festa: ele recitava os versos usando a voz, a entonação, as pausas, o ritmo e a linguagem corporal,
até os pigarros, para enfatizar trechos mais importantes. Um performer.
Suas apresentações se davam nas rádios e em festivais, sempre muito aclamado. Quase um superstar.
Suas apresentações se davam nas rádios e em festivais, sempre muito aclamado. Quase um superstar.
Houve uma época em que
Patativa foi considerado subversivo, porque criticava com seus versos a
dominação econômica sofrida pelos trabalhadores rurais. Ele mesmo se
considerava “um lavrador que poetava” por isso sua poesia era comprometida com
as lides da terra.
Patativa influenciou
vários poetas nordestinos e foi parceiro de Luiz Gonzaga. O grupo pernambucano Cordel
do Fogo Encantado foi um dos que bebeu na fonte do poeta para compor suas
letras.
Em 2009, ano do centenário
de seu nascimento, Patativa foi homenageado com o projeto Patativa do
Assaré Encanta em Todo Canto. Nele, um caminhão percorreu 95 municípios do
Ceará difundindo a poesia popular.
Em 1975 eu estava na equipe
do documentário Nordeste – Cordel, Repente, Canção, da cineasta Tânia Quaresma, quando
fomos na casa dele para entrevista-lo para o filme. Era a mesma casa onde tinha nascido, no
seco sertão cearense. Muita poeira e sol de rachar. Patativa já estava um pouco
surdo e não quis que a gente ligasse o gravador, nem a câmera, assim de cara. Sugeriu uma conversinha pra cada um se conhecer melhor.
- Não quero que você
escreva porque eu prezo a minha voz. Prezo o que eu digo. Depois que a gente se
conhecer, a gente grava.
E assim foi. Depois falou
e falou. Ele e dona Belinha.
Isso faz muito tempo, mas
me lembro de uma frase que ele disse e que me serve pra vida:
- A gente aprende a ler o
mundo e a natureza, antes de aprender a ler as palavras. Só precisa ter olho
pra ver e ouvido pra ouvir.
Já dona Belinha era a parte engraçada do casal.
Eles tinham um cachorrinho
vira-lata, tipo Baleia, de Vidas Secas, com o nome de Resuvio. Assim mesmo.
R.e.s.u.v.i.o. Eu perguntei: porque esse nome, dona Belinha? E ela explicou:
- Resuvio foi o vuRcão
mais importante já inventado pelo homem. Ele é danado, e ninguém consegue
parar. Assim mesmo é meu cachorro.
Isso tá no filme.
Muito amor por esses brasileiros...
Abaixo, Patativa recitando um poema.
Abaixo, Patativa recitando um poema.
9 comentários:
A vida em movimento. Parabéns pelo o belíssimo blog
grata e volte sempre!
Resuvio,adorei
Resuvio,adorei
Parabéns pelo texto! Amei e me emocionei! Patativa do Assaré mora em meu coração!
Que bom navegar e aportar aqui! Gratidāo!!
Coisa linda demais!
Coisa linda demais!
Quantos Patativas precisamos, para nos tornarmos de fato uma nação...???
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