quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Carta de Eduardo Galeano


Prezado Senhor Futuro,
Com a minha maior consideração

Estou lhe escrevendo esta carta para pedir-lhe um favor. O senhor saberá desculpar-me o incômodo. 

Não, não tema, não é que queira conhecê-lo. O senhor há de ser muito solicitado, haverá tanta gente que quererá ter o prazer; mas eu não. Quando alguma cigana me toma a mão para ler-me o porvir, saio correndo em disparada antes que ela possa cometer tal crueldade.

E, no entanto, você, misterioso senhor, é a promessa que nossos passos perseguem querendo sentido e destino. E é este mundo, este mundo e não outro mundo, o lugar onde o senhor nos espera. A mim e aos muitos que não acreditamos nos deuses que nos prometem outras vidas nos mais longínquos hotéis de Mais Além.

E aí está o problema, senhor Futuro. Estamos ficando sem mundo. Os violentos o chutam, como se fosse uma bola. Jogam com ele os senhores da guerra, como se fosse uma granada de mão; e os vorazes o espremem, como se fosse um limão. A este passo, temo, mais cedo do que tarde, o mundo poderá ser não mais do que uma pedra morta girando no espaço, sem terra, sem ar e sem alma.

Disso se trata, senhor Futuro. Eu lhe peço, nós lhe pedimos, que não se deixe desalojar. Para estarmos, para sermos, necessitamos que o senhor siga estando, que o senhor siga sendo. Que o senhor nos ajude a defender a sua casa, que é a casa do tempo.

Quebre-nos esse galho, por favor. A nós e aos outros: aos outros que virão depois, se tivermos depois.

Saúda-te atentamente,

Um Terrestre