terça-feira, 21 de junho de 2016

A coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer





















Eu nunca pensei muito nesse negócio de idade, de ficar mais velha, de cabelos brancos e etc. Me lembro que quando era menina e perguntavam o que ia ser quando crescesse, sempre respondia: “quero ser uma mulher de 30 anos”. As pessoas achavam engraçadinho, mas quando eu falava isso, não tinha a menor ideia do que significava 30 anos pra uma mulher. Pra mim era apenas a idade de uma amiga de minha tia, que tinha pouco mais de trinta e usava vestidos lindos, sapatos de salto alto, batom vermelho e principalmente fumava e falava palavrões. Queria ser assim, solteira e dona de minha vida...

Depois não lembro direito como o tempo passou. Era muita coisa acontecendo... Muitas mudanças no país, na minha família, em mim mesma. Fiz três vestibulares (que na época não eram unificados), passei nos três, comecei a universidade de manhã, de tarde e de noite. Desisti de dois e fiquei só com jornalismo. Comecei a trabalhar em jornal, depois do AI-5 fui expulsa da universidade por ser subversiva,  virei hippie, viajei o país inteiro fazendo reportagens, me apaixonei muito, fui muito amada, morei em comunidade alternativa, adotei a macrobiótica e a ioga, fui morar com um homem por quem me apaixonei, tive dois filhos com ele, aí sosseguei um pouco. 
Depois me separei, viajei, viajei, fiz parte de um grupo feminista, com esse grupo fiz livros e vídeos sobre saúde da mulher, apresentei um programa de radio, encontrei o grande amor de minha vida, tive outro filho, virei produtora cultural, abri duas empresas, tive um restaurante/bar, mudei de cidade, de estado, sempre trabalhando com shows.... ufa... e vivi tudo isso intensamente e fui muito feliz.

Ai o meu amor morreu e meu mundo virou de cabeça pra baixo. E foi só depois disso que tive plena consciência da passagem do tempo. Aquela adrenalina que sempre foi a minha vida acabou... se antes eu era Aries e nesse momento virei Peixes (ascendente). E fui me olhar no espelho e vi que estava muito diferente do que eu era. Ou pelo menos do jeito que eu achava que era... tomei um susto! Falei: Caraca, ano que vem vou fazer 70 anos! Setenta. Setentinha. 3 x 20 + 10. Ou duas vezes trinta e mais dez. E onde ficaram esses anos todos, como eu não vi passar? Difícil dizer.

Hoje minha cabeleira não é mais tão farta nem loura. Os fios são  grisalhos e não escondo mais com tintura, deixa assim. Surgiram as rugas e o brilho da pele se foi. Minha postura corporal também mudou. Podia estar pior, mas dancei muito e fiz ioga por muito tempo, então isso ajudou. O que acontece é que sou hoje uma mulher mais gordinha e calma e recolhida. As crianças me chamam de vovó onde quer que as encontre... E eu gosto, viu?

Mas acho que essa idade é só por fora. Uma vez estava indo pra um teatro com Caetano, no carro da produção, nem sei em que cidade, e a gente conversava exatamente sobre isso, de como o tempo passa tão rápido e a gente nem percebe. Ele falava da mãe dele, que ia fazer 100 anos e achava que ainda era jovem e tratava os filhos como se fossem garotos, dando bronca e tudo. Ele acreditava que todo mundo tem uma idade interna que pode ser completamente diferente da idade do corpo físico. E que essa idade era a gente que escolhia, entre os momentos mais felizes da nossa vida.
Concordo demais com ele. E acho que minha idade eterna é uns 35 anos, naquela época em que vivia mais perto da natureza, com crianças pequenas ao redor, bichos, plantas. São momentos de que me lembro com saudades.

Acho que por isso hoje moro na roça, convivendo com netas e amigos de netas, plantando, ouvindo muita musica, comendo meu arroz integral, vivendo minha vidinha vegetariana e fazendo meditação. Escolhi que a minha batalha hoje é pela qualidade de vida, consumindo somente o necessário, respeitando os ciclos da natureza, convivendo e trocando com as pessoas locais. Ainda não está excelente, mas estou no caminho.
Sei que estou envelhecendo, os sinais já são muito claros, os olhos vão passar por uma cirurgia na próxima semana, por exemplo. Porém me olho no espelho e não fico chateada comigo, não. Podia estar mais jovem se fizesse uma plástica ou se fosse mais na academia, ou mesmo se voltasse aos esportes. Mas não fiz nada disso, acho que nem vou fazer... No meu corpo está a minha história. Foram tantas coisas que já me aconteceram que não podia ser diferente.
E tenho certeza que muitas novidades ainda virão... 
Estou meio velhinha, mas estou viva!

(Tenho anotações de todas as coisas que ainda me lembro e que foram importantes pra mim, e um dia desses publico por aqui).


É muita história, viu?

11 comentários:

Cláudio Luiz disse...

mais que aquela mulher que vc queria ser. e isso é bom.
estou na fila de autógrafo do livro.

Renata Lins disse...

esse post é tão legal... assim cheio de dúvidas... eu não sei, talvez por sempre ter sido cercada de gente mais velha que tava muito na vida, eu nunca achei que ficar velha era, assim, ficar velha. sabe? esse "ficar velha" que não é bom. já vi tanta gente dando virada na vida depois dos 40, dos 50, dos 70... mãe de tia Pilar que começou a pintar com mais de 70 e se achou na pintura, naquela época da vida... isso porque tinha queimado o dedo e não podia fazer crochê. aí que eu tenho a sensação que tem gente que desiste, que cristaliza, que enrijece. mas isso não tem a ver com idade: tem a ver com a forma como a pessoa vive a vida.
é verdade que o mundo capitalista, sua velocidade, sua destruição permanente, hipervaloriza os mais jovens. mas não acho muita graça não... tem gente legal, mas prefiro gente com história.

BethS disse...

sim, sim. é isso mesmo.
tenho a intuição de que está muito perto o momento de aparecer uma nova atividade pra mim, que eu goste, que faça bem. que me deixe feliz.
minha vida tá mudando, como a gente conversou outro dia, não sei pra onde vai essa virada, mas pressinto que vem por aí.
e vou te dizer: adoro esses desafios, porque sei que posso. qualquer coisa, eu posso!!
adoro aquele frio na barriga, de estar me equilibrando, no ar, antes de mergulhar, sabe?
isso aí...
beijo!

Luciana Nepomuceno disse...

eu sempre achei que o mais importante da minha idade era o minha e não o idade (falo do possessivo em primeira pessoa do singular, mas poderia ser em qualquer pessoa, singular).

no corpo tá a história, tem coisa mais linda de ler?

Lia disse...

Textão lindo. <3

Renata disse...

Adorei seu post. Sou uma mulher de 33 e nunca pensei muito em ter esta idade quando era mais nova, como você, mas tenho adorado cada ano a mais que eu tenho e ele me traz.

Espero continuar assim como você.

Letícia disse...

Beth, você é maravilhosa. mal te conheço e já quero abraça-la. ah, dia desses li seu texto sobre a Maria Bethania e amei muito. hoje fiquei feliz que vc visitou meu blog (o mais 20 minutos). sê feliz.

ps:- tenho 30 anos e às vezes me sinto com 70. acho que somos opostas nisso, né? ;)

Rita disse...

Que texto tão tão bom!

Rita disse...

Que texto tão tão bom!

Ana Paula Medeiros disse...

Beth, eu fiz 51 ontem. Há 3 anos me desfiz de uma relação que durou mais de 20 e que foi tão boa, mas tinha secado. Comecei outra que tem me feito feliz como nunca antes (eu sei, a gente sempre tem essa impressão, mas ela é muito forte pra mim). Meu corpo tem um monte de marcas, vou ganhar mais umas mês que vem, numa cirurgia delicada pra arrumar uma endometriose feia.
Mas a sensação é sempre essa, de estar viva, de poder fazer o que eu quiser, de ter frio na barriga mas não temor de recomeçar. De estar aberta para as novidades, para aprender mais, para rir. Eu não sei que idade eu tenho dentro de mim. São muitas, eu me sinto muito atemporal.
Amei demais ler teu texto.
Beijos muitos!

BethS disse...

Ana, a sensação de estar no ar, antes de mergulhar.
o abismo piscando os olhos pra gente lá embaixo...
o desafio...
não sei viver sem esse frisson.
são níveis diferentes, principalmente hoje, mas sempre é essa sensação de "eu posso! estou viva!".
né isso?
você é linda...
beijos muitos também...